Antes de sermos mães temos que enfrentar o que para muitas parece um bicho de sete cabeças que se resume à pergunta: parto normal ou cesária? Influenciadas por nossas próprias mães, amigas, médicos e informações das mídias, cada uma de nós define sua preferência de parto. Mas será que somos bem informadas e, mais importante, nossa vontade é respeitada?

Para encontrar a resposta realizamos uma enquete com 1011 frequentadoras da Famivita que revelou que 73% das brasileiras preferem o parto normal enquanto 27% optam pela cesária. Comparando este resultado com as estatísticas de parto do Ministérios da Saúde fica nítido que tem algo muito errado aqui. Quase 57% dos 2,9 milhões brasileirinhos e brasileirinhas nascidos em 2013 avistaram a luz pela primeira vez por meio do parto cesáreo. Esta pocentagem vem aumentando constantemente há décadas e faz o Brasil campeão mundial nesta categoria.

parto normal ou cesariana no brasil

73% das brasileiras preferem parto normal, 27% a cesariana

Segundo informações da Organização Mundial da Saúde, a cesariana é vantajosa e portanto necessária para a saúde da mãe e do bebê em apenas 15% dos partos. Contabilizando as mulheres que preferem o parto normal, mas que precisam fazer a forma contrária por necessidade, e supondo que toda mulher que prefere o parto cesariano consegue fazer, a taxa de cesárias não deveria ultrapassar 38% em hipótese alguma. Isto significa que quase uma em cada cinco mulheres brasileiras tem sua vontade desrespeitada, ou seja 19%. Até no SUS onde a taxa já passou dos 40% ocorre um excesso. Para somar a média nacional só resta concluir que o excesso na rede particular está muito maior, aproximando-se das 90%.

As Origens do Aumento nos Partos Cesáreos

Um ponto de partida para identificar as origens deste problema não foi difícil encontrar – minha própria história de partos. A pergunta “cesária ou parto normal” sempre teve uma resposta simples para mim: eu queria ter normal! Sabe o que acabou acontecendo? Nenhum dos meus três filhos nasceram de parto normal. Isso não quer dizer que fui completamente desrespeitada porque nos casos das minhas meninas foi inevitável. O parto da Joana foi emergencial mesmo porque não tinha mais líquido amniótico e uma infecção grave já estava se instalando. No caso da Melissa foi resultado da pré-eclâmpsia que poderia levar a uma pressão alta e perigosa, sem falar do risco de uma eclâmpsia em uma possível nova gravidez que viria cheia de riscos para mim e para o bebê. Então, compreensivelmente, o médico optou pela cesariana.

Agora, o parto do Eduardo foi diferente. Não houve necessidade e era possível sim realizar de forma normal. Mas isso ficou claro para mim só muito depois na conversa com outro obstreta. Cheguei à maternidade às 9 horas da manhã com 41 semanas de gestação. Já fazia algum tempo que os sintomas do trabalho de parto começaram, mas nada do Dudu querer sair. Como eu queria ter normal, o médico começou a estimular o parto. Enquanto liquido estava saindo, pois estouraram a bolsa, a dilatação não aumentava. À tarde, o obstetra tomou a decisão, sem me informar, de fazer um parto cesáreo, dizendo que meu bebê não ia passar pelo canal vaginal. Hoje me parece que houve outro motivo que também influenciou: a conveniência do médico de evitar complicações e encerrar seu plantão pontualmente. Mas o que eu iria fazer?

Como podem imaginar, o médico tem um papel crucial na decisão se vai ser um parto normal ou cesariana. Além da conveniência, o parto cesáreo tem uma outra vantagem, tanto para o médico quanto a paciente – ele é planejável. Do lado das gestantes, isto se manifesta como segundo motivo mais citado para este tipo do parto. Para as clínicas, a explicação pode ser econômica, principalmente considerando o fato da taxa altíssima na rede privada. É possível ganhar o valor X em Y tempo – uma maravilha de um ponto de vista do lucro. Dar assistência a uma parturiente normal por diversas horas é simplesmente menos atrativo e também mais prático no ponto de vista do profissional. Os motivos dos médicos a favor do parto cesáreo também são refletidos nas recomendações que eles dão às suas pacientes – razão citada também pelas participantes da nossa enquete.

motivos para parto cesareo

O medo da dor no parto normal é o motivo mais comun para a cesariana

Pesando mais na argumentação contra o parto normal é a dor. E quem não se assusta com o pensamento de que um bebê inteirinho tem que passar pela estreita vagina? Só pelo teste do olhar e as cenas na televisão parece que já dá para sentir a dor, sem contar com os comentários de amigas, mães, mulheres que passaram pela experiência sem medicação para dor. Mas já pensou que a simulação mental do tamanho da dor pode ser mais forte do que a dor real? O corpo feminino tem toda a capacidade para parir um filho de forma natural. Isso não quer dizer que o parto normal não dói porque doi sim, mas para saber de verdade é preciso conhecer, cada mulher sente a dor do parto de forma diferente.

O “pior” momento são as contrações fortes, que nem com anestisia pelidural podem ser evitadas completamente, e nem tanto o momento em que o bebê está saindo. Também é possível reduzir as dores na hora do parto com a preparação psicológica e física. E afinal o que muitas mulheres não lembram quando pensam na dor do parto normal, que a cesariana apesar da anestisia também traz dor – no pós-parto. O tempo de recuperação do parto cesáreo é tipicamente de algumas semanas, enquanto algumas parturientes vaginais podem andar e cuidar do seu bebê ainda no mesmo dia.

Mitos Sobre Parto Normal Depois de Cesárea

A pergunta “normal ou cesáreo?” não existe apenas para o primeiro parto, mas pode e deve é ser presente em todos os partos. Enquanto é bem difundido que uma mulher que teve parto normal pode ter uma cesariana ou inverso constitui um grande mito na vida de muitas mulheres. Elas acreditam que não pode ter parto normal depois da cesárea. Mulheres que tiveram o primeiro parto cesariano podem ter, sim, parto normal em uma nova gestação. Normalmente, a desculpa mais usada para mamães de segunda viagem envolve a condição de anteriormente ter acontecido à cirurgia. Mas não, o parto normal é perfeitamente possível após o parto cesariano.

O parto normal também é possível em uma terceira gravidez com duas cesarianas. Porém, esse envolve um cuidado maior do médico obstetra que cuida da gestante. Teoricamente, qualquer sinal de trabalho de parto traria um risco maior das cicatrizes das cesarianas anteriores se romperem porque o corte já esticado pela gravidez atual se tornaria frágil. Mas ainda, sim, é possível o parto vaginal. Apenas não se aconselha fazer o parto normal em casa e antes do termo após duas cesarianas porque serão necessários aparatos para qualquer eventualidade. A mulher também deve estar de boa saúde e ter uma pressão controlada para o trabalho de parto acontecer normalmente.

Para ter um parâmetro de segurança, o parto cesariano pode acontecer no máximo por três vezes. A partir do quarto , os riscos relacionadas à pressão exercidas em cima da cicatriz aumentam significamente colocando a gestação em geral em perigo. Por outro lado, o parto normal pode ser feito por diversas vezes sem limitações. Mira-se o exemplo de mulheres de tempos passados que tinham 10, 12 ou às vezes até mais filhos quando a fertilidade permitiu.

Preferências e Diferenças no Parto Normal

Enquanto a parturiente de cesariana se entrega completamente nas mãos do médico obstetra, isso não é necessariamente o caso do parto normal. Dois terços das participantes da nossa enquete expressaram o desejo de terem um parto diferente do convencional realizados nas maternidades do país, a saber, humanizado ou natural. Entenda-se para fim da análise as seguintes definições de parto normal:

  • Convencional – realizado com intervenção médica já programada antes do parto
  • Humanizado – realizado com intervenção apenas com expressa vontade da parturiente
  • Natural – realizado sem intervenção alguma

parto normal preferido

Atualmente, não existem estatísticas conclusivas sobre os partos humanizados e naturais realizados no Brasil. Mesmo supondo que algumas mulheres não estavam 100% cientes desta definições na hora de responder e haja mudanças de opinião até o momento do parto, não é preciso conhecer todas as maternidades brasileiras que a realidade está do longe da mulher brasileira. Certamente, menos de 31% dos partos normais feitos são humanizado até mesmo por uma falta de preparação das instituições respectivas para isso.

Graças à mobilização das mulheres brasileiras de cobrar o direito de terem sua vontade respeitada, à maior difusão da temática nas mídias (como no Youtube por exemplo) e à consequente aumento de atenção, há sinais de que está situação pode mudar. Cada vez mais maternidades estão dispostas a seguir os exemplos de instituições de referência para apoiar as mulheres e possibilitar suas livres decisões.

Como Ter Direito ao Parto que Eu Quero

Considero final feliz, um parto que corra tudo bem, que termine mãe e bebê com plena saúde e que tenha a vontade da mulher respeitada. Vimos por esta pesquisa que principalmente o último aspecto está ainda longe da realidade. Muitas mulheres queriam, sim, ter seu melhor momento da vida por vias naturais, assim como sua mãe, sua avó e sua bisavó. Para isso é importante que os profissionais tenham a consciência do que é melhor para a paciente e o seu bebê e sejam abertos a ouvir você. Converse com o médico obstetra que provavelmente acompanhará o parto com antecedência sobre as formas possíveis de parto, seus medos e seus desejos. Caso esteja na situação feliz de poder escolher (e sei que muitas mulheres não podem por falta de opção), procure uma alternativa quando não sente o encaixe perfeito.

O parto cesariano certamente salva vidas, mas há muitos e muitos casos em que é totalmente desnecessário, principalmente em situações forçadas com desculpas irrelevantes e totalmente oportunistas. Não é por acaso que o Brasil lidera o mundo em cesarianas. A esperança é que a iniciativa tomada pelo Governo Federal, que obriga os médicos sob pena de multa de R$25 mil por ocorrência a justificarem sua escolha do parto cesáreo, fortaleça a posição de nós pacientes. Como tem toda a confiança da mulher, o médico por sua vez poderia sugerir o parto normal, por que não? Não há dúvida de que ele seja melhor para mãe e bebê, pois no nascimento via vaginal, as secreções são expelidas na passagem pelo canal cervical, além de claro, favorecer o pós-parto para da mamãe.

Para ter o parto normal que se deseja as condições também devem ser favoráveis. Para ter um parto humanizado, muitas vezes é vantajoso possuir um plano de parto. Além disso precisa de um médico que o acolha 100% porque sem isso o parto nunca será como a mulher imagina. Como a tranquilidade é fundamental neste momento, a confiança no profissional que nos acompanha é o mais importante. Isso também vale para o parto domiciliar.

Mas não são somente os fatores externos que decidem se o parto vai ser o tão sonhado. Precisamos estar preparadas psicologica e fisicamente. Para um parto normal, a mulher pode se alimentar de forma correta e fazer exercícios diariamente para facilitar a dilatação, não ganhar muito peso durante a gravidez e evitar problemas severos de saúde. Com a devida liberação do médico, a mulher que pretende ter parto normal pode fazer natação, yoga e pilates. Se for atleta antes da gravidez, o ritmo deve ser reduzido.

Fotos: Acervo Pessoal TF