Imagine que você precisa sair de casa, mas aí, logo que acorda, percebe que está com grandes manchas vermelhas no rosto. Você tenta disfarçar com maquiagem e encara sua rotina, mas, mesmo assim, no local onde estuda ou trabalha, nota que todos estão olhando para o rubor da sua face.
Quem tem acne, já passou por isso literalmente na pele, mas esse não é o único fator que faz com que algumas pessoas não consigam encarar as outras nos olhos, com segurança. A rosácea também é uma grande vilã quando se fala das condições cutâneas que afetam a autoestima, atingindo em cheio a vida social e familiar da pessoa.
ATÉ MESMO COISAS SIMPLES PODEM DESPERTAR A ROSÁCEA
Para se ter uma ideia, pesquisas da Sociedade Nacional da Rosácea apontam que mais de 76% dos pacientes com essa enfermidade acham que isso diminui sua autoconfiança, com 41% afirmando que faz com que evitem o contato público ou cancelem compromissos. Assim, embora seja uma doença que não apresenta risco de vida, tem um impacto negativo na qualidade dela.
A pele do rosto de alguém com rosácea é bastante sensível e frequentemente fica ardendo, por isso, o uso de cosméticos inadequados vai se traduzir em irritação. Conforme o tempo passa, pode acontecer da vermelhidão começar a ser frequente ou mesmo permanente, com o característico surgimento de vasos finos, pápulas (caroços pequenos, elevados e moles) e pústulas (bolinhas na pele, com pus). Dependendo do tipo de rosácea, inclusive, o aspecto pode ser semelhante ao das espinhas.
Em geral, a rosácea alterna fases de crise e melhora. Além disso, tudo que envolve dilatação dos vasos sanguíneos e até mesmo momentos simples que compõem o cotidiano, como o consumo de alimentos picantes, ingestão de bebidas alcoólicas e atividade física podem despertá-la. Surgiu alguma dúvida a respeito do tema? Aqui explicaremos tudo sobre esse assunto.
- Características da rosácea
- Tipos de rosácea
- A importância da limpeza e hidratação
- Outros aspectos da skincare de quem tem rosácea
Características da rosácea
A rosácea é uma doença relativamente comum, um pouco problemática e difícil de controlar. É multifatorial: envolve uma série de questões, como predisposição genética, anormalidades do sistema imunológico e desregulação neurovascular (ou seja, ela abarca a rede de vasos sanguíneos que banha o sistema nervoso central), além de elementos que podem desencadear seu surgimento.
A rosácea é crônica e dispõe de ampla distribuição mundial (5% de afetados, globalmente), predominando em populações de fotótipos baixos (pele clara e muito clara), mas pode atingir também diferentes etnias. Um discreto predomínio feminino é observado e, embora acometa igualmente crianças e idosos, a faixa etária mais frequente é entre 30 – 60 anos.
A rosácea já foi apelidada de “acne rosácea” e confundida com a acne. Realmente as duas têm semelhanças, como as lesões, o padrão irregular na pele, com as bolinhas e a presença de pus, em alguns casos. Ambas também costumam responder bem ao tratamento com antibiótico.
Mas as afinidades entre as duas param por aí: a rosácea é diferente da acne, especialmente por não ter comedões – os famosos cravos, ou seja, aquela obstrução dos poros por queratina e sebo – nem oleosidade aumentada. Isso é importante porque os produtos para pele com acne costumam ser irritantes e secativos demais, isto é, não são adequados para quem tem rosácea.
NA PELE COM ROSÁCEA, A BARREIRA PROTETORA NÃO É TÃO EFICIENTE
A epiderme, a camada mais superficial da pele, onde existe a barreira cutânea (que tem a função de proteção), é a região mais prejudicada nas pessoas com rosácea. A epiderme é um tecido que recobre a pele e a chamada “camada córnea” é a parte mais externa.
A epiderme é composta em sua maioria por queratinócitos (produtores de queratina). São eles que vão dar estrutura à epiderme e fazer com que ela seja capaz de absorver substâncias (ou seja, conferir permeabilidade).
Mas como entender os processos que envolvem, por exemplo, a ativação da rosácea? Acompanhe:
- Quando os queratinócitos migram para a superfície da pele, eles vão se separando e transformam-se em queratinócitos mortos – a esse processo se dá o nome de “queratinização”. Esse aglomerado de queratina (também conhecidos como corneócitos) compõe a barreira córnea;
- Além dos corneócitos (que contêm 70-80% de queratina), esta barreira é constituída por 20% de lipídios (ceramidas que preservam a pele) e 15% de água, responsável por proteger o meio interno da perda de água, regulando a hidratação;
- O fator de hidratação natural ou Natural Moisturizing Factor (NMF) que está dentro dos corneócitos, é formado por substâncias que absorvem água, e é esta água que fica retida no estrato córneo;
- A água que vem da derme, passa pela camada córnea até à superfície da pele, onde é evaporada, e reflete o equilíbrio entre o conteúdo de água na epiderme e a umidade do meio ambiente;
- Assim, a rosácea surge dessa barreira cutânea alterada, com um aumento desta TEWL, provocando a desidratação cutânea. Flushing (vermelhidão e calor) ocorrem facilmente, assim como ardor, sensação de picada e coceira.
Esta barreira é coberta pelo que se chama em dermatologia de “filme hidrolipídico”, uma mistura de suor e sebo, levemente ácida, que evita a desidratação.
A retenção de água no NMF, através dos lipídios e do filme hidrolipídico, representa a chamada “hidratação estática da pele” (ou água estática), porque ela não circula pela pele.
Este processo é conhecido como perda transepidérmica de água (TEWL, do inglês “transepidermal water loss”) e indica a hidratação dinâmica da pele, ou água dinâmica (porque circula pela pele).
A rosácea afeta os vasos sanguíneos e as glândulas sebáceas, principalmente na zona central do rosto (nariz, bochechas, testa e queixo). Áreas com tendência maior a danos solares, a exemplo de orelhas, couro cabeludo, pescoço ou parte superior das costas também podem ser alvo de lesões.
Os especialistas na área supõem que existe uma grande taxa de subnotificação de rosácea. Isso porque só em casos mais graves as pessoas buscam as consultas médicas, daí os casos menos severos não seriam relatados.
Tipos de rosácea
Em 2002, a Sociedade Nacional da Rosácea criou um sistema de classificação para esta condição, com o objetivo de tornar mais uniforme o diagnóstico da doença. Tal sistema está dividido em características primárias e secundárias, sendo que com a presença de um ou mais aspectos primários já é possível se obter um diagnóstico positivo.
Em relação às características secundárias, estas podem ou não estar presentes e em alguns casos, aparecem de forma isolada. No entanto, a combinação de dois ou mais sinais secundários não é suficiente para o diagnóstico.
ACREDITA-SE QUE A RAZÃO DA ROSÁCEA ATINGIR MAIS O ROSTO SE DEVE ÀS GLÂNDULAS SEBÁCEAS
Os sinais primários compreendem flushing ou rubor, vermelhidão persistente, pápulas, pústulas e vasos dilatados. Já os sinais secundários incluem ardor ou picadas, placas (várias pápulas juntas, conferindo saliências), secura nos olhos, inchaço, manifestações oculares e alterações fimatosas – quadro em que a pele engrossa e ocorre o aumento do volume nasal e por vezes do queixo.
Em relação aos subtipos da rosácea, eles se apresentam do seguinte modo:
- Subtipo I ou a rosácea eritemato-telangiectásica (ETR) – É considerado o mais comum. Nele é evidenciada uma pele de textura fina, com onda de calor, seguida por avermelhamento, que pode durar mais do que 10 minutos, e/ou vermelhidão central facial persistente, normalmente acompanhada de picadas ou ardor.
- Subtipo II ou a rosácea pápulo-pustulosa (PPR) – É como se mostra a rosácea clássica. Em geral, acontece em mulheres de meia-idade. Caracteriza-se por carocinhos pequenos e bolinhas na pele com pus), distribuídos também pela área central do rosto, perto das cavidades do nariz, dos olhos e ao redor da boca. Em casos mais graves podem evoluir para um inchaço crônico (edema facial).
- Subtipo III ou a rosácea fimatosa (PhR) – É a forma predominante nos homens (especialmente acima dos 40 anos de idade), sendo visto como o estágio mais grave. Tem como particularidade uma pele grossa com nódulos inflamatórios que aumentam o tamanho do nariz, mas pode ocorrer em qualquer região facial sebácea (como orelhas, pálpebras, queixo e bochechas).
- Subtipo IV ou rosácea ocular – Conforme aponta a Sociedade Nacional da Rosácea, esse estágio é descrito por sintomas como olhos aquosos ou vermelhos, ardor ou picadas, secura ocular, comichão, fotossensibilidade e visão turva. É o subtipo mais reportado pelos oftalmologistas, com taxas de incidência de 6% a 72%.
Os pequenos vasos sanguíneos dilatados são comuns, mas não são necessários para o diagnóstico da ETR. A pele à volta dos olhos normalmente não é afetada. O flushing pode ser causado por fatores como estresse, exercício, clima quente ou frio e até banhos de água quente.
Os vasos dilatados são menos comuns do que no subtipo I, assim como o rubor é menos frequente e menos grave. Um inchaço próximo à área dos olhos pode ser um primeiro sintoma desse subtipo.
Esses nódulos, se pressionados, liberam uma substância pastosa, composta por células e microrganismos.
Entre os sintomas da rosácea ocular estão ainda a sensação de corpo estranho no olho e vasinhos vermelhos na conjuntiva (que é uma membrana mucosa, fina e transparente que recobre a parte branca do olho e também as pálpebras, internamente), além de vermelhidão nas pálpebras e ao redor dos olhos.
Esses sintomas nos olhos normalmente aparecem antes dos sinais na pele, mas também podem ocorrer ao mesmo tempo. Assim, quando houver algum desconforto ocular, quem tem rosácea deve ser encaminhado também para um oftalmologista, pois isso vai garantir um menor risco de perda visual. A rosácea ocular afeta igualmente os dois sexos.
Além desses subtipos ainda há duas variantes (consideradas raras):
- Rosácea granulomatosa – Caracterizada por nódulos duros de cor avermelhada, que podem se transformar em cicatrizes, nos casos mais graves. Elas variam de tamanho e estão situadas na parte superior da face, em volta dos olhos e nariz, e também no pescoço.
- Rosácea fulminante – Muito severa, ela surge de forma repentina em mulheres jovens (geralmente na faixa entre 15-46 anos), na forma de nódulos e irregularidades na pele cheias de pus, com formação de cistos.
A importância da limpeza e hidratação
Não há cura para a rosácea, mas na atualidade há diferentes maneiras de amenizar os sintomas dela, fazendo com que as crises sejam menos frequentes e dolorosas. O ideal é manter a pele no melhor estado possível, tendo uma disciplinada rotina de cuidados.
Em primeiro lugar, deveria se pensar na sensibilidade aos cosméticos, pois existem muitas fórmulas que secam e irritam a pele propensa à rosácea. Isso acontece possivelmente como resultado da barreira cutânea enfraquecida ou mesmo devido à hiperreatividade vascular (a responsável pela dilatação dos “vasinhos”).
A sensibilidade pode aumentar não apenas pela exposição a muitos produtos de higiene, mas também em razão de como se “manuseia” a pele.
Acerca da limpeza, os produtos mais indicados pelos especialistas costumam ser os syndets (sabonetes fabricados a partir de componentes sintéticos e não de sabão) ou as loções de limpeza, porque têm menor potencial de irritação. Ambos, além disso, depositam componentes benéficos na pele, apesar do curto contato durante a limpeza e enxaguamento.
Para ser considerado ótimo para quem tem rosácea, o limpador deve remover a sujeira, oleosidade excessiva, poluentes ambientais e bactérias prejudiciais da pele, sem alterar ou remover lipídios, proteínas e a flora normal da pele.
NA HORA DE APLICAR O LIMPADOR, É IMPORTANTE QUE SE FAÇA SUAVEMENTE
Idealmente, é interessante proceder com uma limpeza suave, apenas duas vezes ao dia, com limpadores de pH de 5.5, pois eles ajudarão a barreira cutânea, limitando a dilatação dos vasos, diminuindo a sensibilidade e neutralizando a secura, evitando, além disso, o crescimento de certos microrganismos.
Uma outra coisa a se ter em mente é que o potencial de irritação de um limpador pode aumentar se ele for deixado na pele mais tempo.
Qualquer tipo de tônicos, abrasivos e adstringentes que contêm álcool, mentol, cânfora, óleo de eucalipto ou similares, fragrâncias e parabenos na composição, devem ser evitados. Também se desaconselha a esfoliação.
Outro ponto crucial desta rotina seria a hidratação, pois ela atua impulsionando o conteúdo de água na pele. Os hidratantes contêm lípidos que amaciam e restauram a elasticidade e a chamada “homeostasia” da pele – a propriedade que não só a pele, mas todo organismo tem, de permanecer em equilíbrio mesmo quando ocorrem mudanças radicais no meio externo. Todo esse contexto evitaria, assim, a perda transepidérmica de água. Substâncias como ceramidas, ácido hialurônico e niacinamida, são famosas pelos seus efeitos benéficos em relação a isso.
Outros cuidados genéricos que ainda devem ser enfatizados, pois podem fazer a diferença no dia a dia de quem tem rosácea, referem-se:
- Hidratação do organismo – A desidratação pode aumentar e também agir como gatilho para processos inflamatórios nas células e, por conseguinte, nas camadas da pele.
- Redução dos níveis de estresse – Já se sabe que o estresse afeta a pele e quem tem rosácea, claro, não está livre de ter uma piora em decorrência dos momentos de tensão. Como alternativa se sugere fazer exercícios moderados, a exemplo de caminhada, e dormir ao menos sete horas por dia.
- Para os homens que têm rosácea, geralmente a orientação é que usem uma máquina de barbear elétrica em vez da lâmina, de modo a poupar um pouco mais a pele do atrito e agressão.
Outros aspectos da skincare
Quem tem algo visível e crônico na pele, como a rosácea, entende que às vezes a aparência facial se transforma em um estado emocional. Funciona assim: a pessoa se sente bem se a pele estiver boa e tem, digamos, uma grande baixa de humor, quando a doença se agrava.
Nos momentos de crise, todavia, é importante ter em mente que não existe uma pele padrão, ideal e perfeita, livre de poros, irregularidades, elevações e áreas vermelhas, só para citar alguns exemplos. Assim, nenhuma pessoa deveria se submeter ao que é enxergado pelos outros como esteticamente aceitável ou desejável na aparência facial.
Uma outra forma de superar essas fases mais difíceis é lançar mão do “arsenal” cosmético que existe na atualidade, adaptando a utilização dos produtos de modo a amenizar os sinais da doença. Todavia, é preciso salientar que uma rotina de skincare, voltada para esse tipo de problema, deve ser baseada na simplicidade. E isso não só em relação ao número de produtos, mas em relação às fórmulas.
Assim, os cosméticos devem contar com poucos ingredientes, sendo que itens que contenham ácido hialurônico, aloe vera, niacinamida e águas florais são sempre bem-vindos.
A proteção solar seria, igualmente, um ponto crucial nessa rotina, já que a atuação esperada dela é assegurar o nível de fotoproteção e diminuir os sintomas – facilmente provocados pela exposição solar, pois a própria radiação UV é um fator desencadeante.
A ideia é passar diariamente um produto com fator de proteção solar (FPS) elevado (50+). É interessante também que ele seja fluido o suficiente para ser espalhado de uma maneira branda pela face.
Pela sua formulação simples e eficiente, os filtros físicos ou minerais com titânio e óxido de zinco (aqueles que deixam uma camada branca sob a pele) são os mais indicados, embora nem sempre sejam os que melhor se adequam esteticamente, afinal, nem todo mundo quer usá-los no rosto.
A água termal, que pode ser adicionada logo após a limpeza, ou seja, antes da hidratação, é outro item bastante orientado pelos dermatologistas, já que muitas delas têm elementos com ação calmante, anti-inflamatória e até mesmo cicatrizante.
Uma rotina de skincare direcionada para a parte da manhã, por exemplo, poderia ter como passos:
- Limpeza;
- Tônico calmante (podendo ser uma água floral) e/ou água termal;
- Hidratante leve;
- Protetor solar.
Nas rotinas de skincare em geral, no período noturno, se faz a limpeza, tonificação e hidratação, sendo que ela é mais concentrada em ativos anti-idade. Contudo, quando se tem rosácea, é preciso prestar atenção a alguns componentes com função de rejuvenescimento, como retinol, ácido glicólico e ácido salicílico. Embora eles não sejam considerados exageradamente irritantes, costumam ser desaconselhados.
É IMPORTANTE QUE SE CONSULTE O DERMATOLOGISTA QUANDO SE DESEJA INSERIR ALGUM PRODUTO MAIS COMPLEXO NA ROTINA
Outro ponto a ser observado é o uso de maquiagem, pois muitas vezes ela é indicada pelos especialistas como complemento da terapêutica. O intuito seria trazer mais segurança e autoestima, especialmente no cotidiano de trabalho e das relações, até mesmo porque a qualidade de vida tem totalmente a ver com o controle das crises de rosácea.
A regra básica quando se fala de maquiagem para rosácea segue o mesmo princípio da skincare: a preferência deve estar no uso de produtos com poucos ingredientes. Isso porque eles são geralmente mais fáceis de aplicar e de remover e, caso a inflamação esteja ativa, tal fato será ainda mais importante.
No caso das bases, por exemplo, pode-se optar por formas mais líquidas, e que não sejam à prova d’água, pois estas costumam ter mais componentes irritantes. Em geral, os produtos de uma maquiagem para quem tem rosácea não devem ter perfume e não devem ser comedogênicos (obstruir os poros).
Importante destacar que numa pele inflamada, deve-se evitar qualquer fricção, que acentua a vermelhidão e torna o gesto da maquiagem desagradável à pele. Assim, tanto a aplicação quanto a remoção, precisam ser feitas com extrema suavidade.